Apascentando ovelhas



Domingo, após o graffiti, eu e minha mãe saímos para visitar nosso amigo Róbson e sua família, aqueles que estão morando num prédio abandonado en Icaraí.
Levei o fogareiro de duas bocas para ele, mas não conseguimos comprar o gás (só o botijão), final de mês é complicado. Blunt também doou umas roupinhas bem legais, que serviram nos meninos. Que bom, não gosto de chegar lá de mãos vazias.
Róbson sempre é animado, mas neste dia estava deprimido, como quem está a entregar os pontos, desistindo.  Ele é uma pessoa curiosa, homem valente, de fibra, realmente, un príncipe do Senhor, há algo de realeza nele, um queixo forte, uma altivez de quem não se dobra diante das circunstâncias. Mas naquele dia, ele estava profundamente abatido. E me explicava as razões:
- Tenho pensado, acordar cedo pra que? Catar lixo todo dia pra que?Pra ganhar cinco reais? Vai adiantar oque? Os meninos nem querem estudar, vê se alguém escovou os dentes hoje? Meninos, quem escovou os dentes hoje?
Resposta nenhuma.
- Viu? Nem escovam os dentes, vão ficar como eu, sem dente, sem estudo, sem emprego, sem casa...
Esse era o estado de espírito de nosso amigo. Totalmente desesperançado..  Minha mãe conversou com ele que ela poderia conseguir um emprego de servente para ele, caso ele quisesse.
- Se você quiser, Róbson. Se você não quiser, tudo bem, de repente eu estou achando que estou ajudando e estou atrapalhando. Você quer trabalhar? Posso trazer o encarregado de obras aqui?
- Dona Izabel, II Tessalonicenses 3:6-18 II :" quem não quer trabalhar, não coma". A senhora não só pode como deve, por favor, traz ele aqui.

Minha mãe estava testando ele, também. Afinal, alguns moradores de rua não querem sair da situação em que se encontram. Mas, ao invés de fazer oque a maioria faz, que é condenar (como disse um conhecido nosso "esse pessoal não quer nada, eles botam as crianças pra trabalhar e ficam em casa á toa". Os filhos do Robson só vaõ pra rua quando vão pra escola ou ao mercado), minha mãe preferiu testar. E levou essa bordoada gospel, mas ficou feliz, saiu um peso do coração dela.
Combinamos de apresntar o Robson ao Marcelo, para a vaga de servente. Marcelo é um homem muito bom, muito correto,e muito ocupado. E tem várias obras grandes em Niterói e quando explicamos a ele a situação do Robson, seu coração se encheu de compaixão:
- Olha Izabel, posso por ele pra trabalhar como servente. não estou precisando, não, mas boto ele pra trabalhar, só pra ajudar o rapaz.

Mas a depressão estava pesando sobre os ombros do Robson.  Talvez pela falta de água, ou pelos mosquitos enormes, o calor ou o frio, ou o fato de dormir a céu aberto, mesmo estando na garagem, ou tudo junto. E ainda tinha o cãozinho que o Marlon criava, que estava com uma ferida enorme e aberta, cheia des moscas. Aconselhamos ele a se livrar do cachorro para evitar doenças, mas os olhos do marlom baixaram sem que a gente percebesse. Não sabíamos que o cachorro era dele, não o havíamos visto ali antes. Quando descobrimos que era da família, pedimos mil desculpas ao Marlonzinho, como minha mãe o chama. Nos comprometemos de levar aquele remédio roxo e de pedir ajuda a uma também bondosa amiga, a Marta, veterinária. Quem sabe ela não tinha umas amostras grátis pra ajudar o cachorro?

Por fim, mesmo com um horizonte novo pela frente e o barulho das águas aumentando pra abrir o mar, a tristeza ainda era profunda e contagiante. Oramos antes de ir embora, eu nem ia pregar, de tão constrangida que eu estava. Tão diferente de pregar nas igrejas, com muito glitter e purpurina, e sem responsabilidade alguma com oque está falando, afinal, já acostumamos a não ter responsabilidade com o irmão e com oque a pregação produz na vida dele. Ali não é assim. Não que eu não me importe com os irmãos, mas a estrutura da igreja hoje é assim. A comunhão se restringe a orar pelo irmão e falar de Deus pra ele: é uma comunhão da boca pra fora. Não chega no sentido amplo da palavra que tem a ver com a generosidade, que vem da compaixão, da identificação com o próximo. É uma comunhão superficial como poça dágua, daquelas que não molha nem as canelinhas de uma formiga, parafraseando Nelson Rodrigues.
Mas, orando, comecei a sentir a presença de Deus e sinalizando que eu precisava pregar pra eles, estava ali pra isso. Então, sem pegar a Bíblia, comecei a falar de Davi, quando foi cercado por Saul e seu exército. Davi, ungido por Deus, mas foragido, o inimigo público número 1 de Israel. A morte era uma questão de segundos. Davi estava escondido numa rocha.  Então, um mensageiro de Saul chegou e disse a ele qeu os filisteus invadiram a terra. Sem pestanejar, Saul recuou e partiu pra defender seu território, e Davi foi salvo. Expliquei que estar escondido na rocha sigrnificava, naquele dia, para nós,  "estar escondido em Jesus, e que aquele local passou a ser  conhecido como Sela Hamalecote(pedra de escape). Eles se divertiram com o nome, só isso já valeu o dia. Robson perguntou onde estava aquilo na Bíblia, pois ele queria ler mais tarde (dá-lhe, bereano). Eu peguei a Bíblia dele e abri em 1ª Samuel 23:28 (quando saí pra grafitar, peguei várias bolsas com latinhas e esqueci a bíblia em cima da mesa) e concluí dizendo a ele que Deus daria a ele o escape daquela situação, mas ele precisava estar escondido em Cristo.

Robson fez suas objeções:
- Mas Davi era um homem de fé, ficou cercado e teve fé, eu não tenho a fé que ele tem.
- Olha, a Bíblia não menciona a reação de Davi. Acredito que quando Davi se viu cercado, pensou o óbvio: "Até aqui me ajudou o Senhor, muito obrigada por tudo, meu Deus, estou salvo, posso morrer em paz", ou algo assim. Mas a Bíblia não menciona oque ele pensou. mas nos salmos dele vemos que ele era como eu e você, a fé as vezes não acompanha a gente. Ele escreveu: "Ó, minha alma, aquieta-te" várias vezes. Porque não tinha quem pregasse pra ele, não tinha quem ministrasse a ele. Estava só. Então pregava pra si mesmo. Você precisa ministrar a você, também: "Acalma. Vai dar tudo certo".
- Ah, viu? Mas ele tinha fé pra isso. Eu não tenho.
-Não? olha a situação onde você  está. Muita gente está aí fora pirando por menos que isso. Você, não, está mantendo a família unida, cuidando das crianças, não está fazendo bobagem. Você está resisitindo bravamente. Isto é milagre, Robson. Ver anjos não é milagre, ver cego enxergar não é milagre, mas ver você passando pelo vale e andando no caminho estreito, isto, sim, é milagre. É fé.
- Poxa, eu não tinha pensado nisso. Eu precisava ouvir isto.
"Eu também"-pensei.

Nos despedimos e saímos com a tarefa de conseguir o gás, o remédio violeta e a veterinária pro caozinho, o emprego pro Robson e um kit pra desenho pra Fabrício, qeu tem 7 anos e desenha muito pra idade.
Este foi o dia. Graffiti, encontro com Israel Pedrosa, visita ao Robson, e depois emergência com André que estava precisando fazer nebulização.
Perdemos o horário no hospital e não fomos à igreja. Mas, como costumo dizer, não fomos à igreja (com crase), mas fomos a igreja.

Em Cristo,
Lya Aves
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